POR QUE JESUS TERIA DE NASCER NA JUDÉIA?
PERGUNTA:- Jesus teria que nasce faltamente na Judéia, para ter bom êxito na sua missão redentora? Porventura não existia, na mesma época, algum outro povo que, espiritual e psicologicamente, pudesse servir para o mesmo objetivo?
RAMATÍS:- Desde que a Administração Sideral reconhecesse, em qualquer outro povo, qualidades e até os defeitos peculiares do judeu, é óbvio que Jesus não precisaria se encarnar em Israel. Mas a Judéia e os hebreus, embora considerados na época “uma coleção desprezível de escravos” (Opinião de Tácito), por sua fé religiosa e capacidade de adaptação a todos os misteres da vida, e que realmente ofereciam as condições psicofísicas eletivas para o melhor sucesso da missão salvacionista do Messias. Aliás, o Velho Testamento sempre o considerou o povo eleito para o advento do Messias, e o próprio Moisés, no monte Sinai, ao unificar a revelação espiritual para um só Deus – Jeová – lançou as bases preliminares do Cristianismo! Isso aplainou o caminho para o Mestre Jesus consolidar a sua obra, dispensando-o do espinhoso trabalho de fundir diversos deuses pagãos numa só unidade, como ele depois pregaria através do seu sublime Evangelho.
É óbvio, portanto, que só uma raça estóica, ardente e fanática em sua crença religiosa monoteísta seria capaz de corresponder ao convite espiritual de Jesus, sem qualquer resistência ou sarcasmo à encantadora mensagem da “Boa Nova” e do “Reino de Deus”! O judeu traz o seu sentimento à flor da pele e vive mais pela fé do que pelo raciocínio, embora seja instintivamente muito sagaz para negócios e especulações da vida humana. Mas, em questão de crença e de devoção, ele pouco indaga dos motivos que o mandavam proceder deste ou daquele modo com o seu Deus. A sua fé inata não pedia explicações intelectivas, ele cria e obedecia cegamente naquilo que transcendesse o seu mundículo de atividades humanas. Por isso, Jesus encontrou o caminho aberto para a sua prédica evangélica entre os judeus, sem precisar destruir o antropoformismo de Jeová, sem alterar as legiões angélicas, sem desmentir os velhos patriarcas e profetas do Antigo Testamento. Ele viera iluminar, ou ampliar os próprios ensinamentos de Moisés e torná-los mais amenos quanto à sua responsabilidade moral. Substituía o conceito pessoal e punitivo de “olho por olho e dente por dente”, pela condição cármica de “quem com ferro fere com ferro será ferido”, na qual Deus não castiga, mas é a própria criatura que se pune dos seus pecados, aceitando, espontaneamente, os mesmos efeitos das causas perniciosas movimentadas no passado.
Jeová, sob o toque sublime dos ensinos de Jesus, tornava-se mais tolerante, terno e compassivo, diminuindo suas exigências demasiadamente humanas. Isso atendia às simpatias dos galileus, que eram considerados gentios ignorantes dos formalismos religiosos, e que aceitavam, sem protestos, a nova versão de Jeová, distanciando-se cada vez mais das seitas religiosas e dos bens do mundo. Mas os fariseus, embora sem qualquer temor dos ensinamentos daquele rabi da Galiléia, perceberam que se enfraquecia a virilidade doutrinária de Moisés. E a perigosa desumanização de Jeová poderia trazer sérios prejuízos aos cofres do Templo! Daí por diante, eles passaram a vigiar Jesus e recear os efeitos de suas idéias desagregadoras na comunidade dos galileus.
PERGUNTA:- Jesus também não poderia comprovar sua missão, se encarnado entre outras raças, que, igualmente, adoravam a Divindade e rendiam-lhe cultos religiosos? Que lhe parece?
RAMATÍS:- Não é somente o culto religioso, a devoção pobre ou fidalga, mas acima de tudo importa distingui, num povo ou raça, qual o sentimento que o anima nessa crença religiosa. Há cultos religiosos de natureza profundamente racionalista, ou excessivamente interesseiros, que se devotam a diversos deuses. A missão de Jesus, em seu início, e acima de tudo, pedia “sentimento puro”, fé inabalável, humildade absoluta e certa ingenuidade dos seus simpatizantes, a fim de cimentar-se rapidamente, sem discussões estéreis, especulações fatigantes ou dúvidas mortificantes. Tendo seu início nas raízes mais profundas do coração humano, só a valorização imediata de sentimentos e de emoções quase infantis poderia sust4ntar o Cristianismo no seu berço, até aliciar, mais tarde, os testemunhos próprios dos intelectos mais desenvolvidos. Hoje, o Evangelho é, sem qualquer hesitação, uma doutrina respeitada pelos cérebros de maior cultura filosófica e científica do mundo, considerado um poema de beleza e um tratado de libertação do espírito aguilhoado à animalidade biológica. Raros homens puderam entender quantas dificuldades Jesus encontrou nos primeiros dias de sua pregação doutrinária, quanto ao seu cuidado para que fosse afastada e superada qualquer excrescência do mundo. Os próprios espíritas de hoje podem avaliar esse zelo de Jesus para manter a pureza iniciática do Cristianismo, pelo esforço que também fazem para evitar que o Espiritismo codificado sofra as deformações, os ridículos das práticas supersticiosas impróprias à sua mensagem de libertação espiritual.
Por isso, Jesus teve de recorrer exclusivamente aos homens brutos, ignorantes e intempestivos, porém simples, francos, humildes e sinceros em suas emoções, como foram os apóstolos. Eles jamais contestavam os ensinos do Mestre, nem lhe opunham as conclusões próprias dos malabarismos do intelecto. Bebiam aas palavras que lhes eram transmitidas noticiando o “Reino de Deus” e criam cegamente naquela mensagem de ternura e esperança infinitas! Assim foram eles o cimento vivo que solidificou os fundamentos do Cristianismo, até se tornar resistente e imune às influências dos credos pagãos da época e às distorções religiosas, próprias das falsas interpretações pessoais.
Devido ao seu fabuloso conhecimento sobre a psicologia da alma humana, Jesus sabia dos prejuízos que sua obra sofreria, caso recorresse, de início, ao intelecto dos homens em vez de falar-lhes ao coração. Os seus primeiros discípulos teriam de ser criaturas descomplexadas, com emoções à flor da pele, tal quais as criancinhas, “porque delas é o reino dos céus”. Artista Divino, trabalhando há dois mil anos com material tão deficiente como o pescador, o camponês, o publicano e a prostituta, Jesus esculpiu na carne humana as figuras monumentais de um Pedro, João, Mateus, Tiago, Timóteo, Madalena e outros! Só depois que o coração dos simples consolidou a base do Cristianismo é que o Alto entoa recorreu mais propriamente ao intelecto, chamando ao movimento libertador cristão a figura de Paulo de Tarso. Mesmo José de Arimatéia, Nicodemos e Gamaliel, homens de cultura e de relevo na época, gozaram de certa credenciais junto ao Mestre, porque, simpáticos à doutrina dos essênios, já eram humilde de espírito. (NOTA DO REVISOR:- Essênios ou Terapeutas, cuja fraternidade perde suas raízes além das civilizações já conhecidas. Em remota antiguidade, foram conhecidos como os profetas brancos para os quais a reencarnação e a Lei do Carma eram assuntos familiares.
Sem dúvida, empolga-nos reconhecer que a mesma doutrina, cujas bases Jesus assentou na rudeza e simplicidade de um Pedro, na sublimação de Madalena e na sinceridade do publicano Mateus, mais tarde, geraram um Agostinho, discípulo apaixonado de Platão e cuja eloqüência, ao expor a teologia Cristã, abalou Roma e Cartago; ou ainda, o maior filósofo da Igreja, como é Tomás de Aquino, um dos maiores gênios da Idade Média na propaganda do Catolicismo. Mas prevendo também o perigo do intelecto desgarrar-se em demasia e depois formalizar o Evangelho acima do coração humano, aristocratizando em excesso o clero responsável pela idéia cristã, o Alto recorre então ao mesmo espírito que fora o apóstolo João, e o faz renascer, na terra, para viver a figura admirável de pobreza e renúncia de Francisco de Assis! Assim o calor cordial do sentimento purificado e a abdicação aos bens transitórios do mundo, vividos pelo frade Francisco de Assis, reativaram novamente a força coesiva e poderosa que cimentou aas bases do Cristianismo nas atividades singelas de pescadores, camponeses, publicanos e gente de mau viver! Na comunidade da própria Igreja Católica, transformada em museu de granito e mármore, cultuando as quinquilharias de ouro e prata entre a púrpura e o veludo dos sacerdotes, o Alto situou Francisco de Assis, convidando todos os eclesiásticos à volta ao Cristo Jesus da simplicidade, da renúncia e do amor! Infelizmente, só alguns raros espíritos que mourejam no seio do Catolicismo entenderam o divino chamamento e, realmente, passaram a viver os preceitos puros do Cristianismo nascido à beira do mar da Galiléia!
No entanto, imaginai Jesus tentando alicerçar sua mensagem deísta entre a versatilidade dos deuses pagãos da Grécia, dos povos bárbaros da Germânia, dos fanáticos da Gália, dos espanhóis agressivos, dos selvagens da África, dos feiticeiros da Caldéia ou das castas orgulhosas da Índia massacrando o pária infeliz? Sem dúvida, o Mestre fracassaria atuando no seio dessas multidões rústicas, fanáticas, irascíveis e politeístas, que se dividiam em castas de sacerdotes e párias, escravos e senhores, além do seu culto aos deuses protetores das mais variadas paixões do mundo.
Aliás, convém não esquecer que Paulo de tarso, depois que Jesus já tinha sido crucificado, foi alvo de risotas e zombarias, quando tentou pregar entre os gregos altamente intelectualizados alguma coisa do Evangelho.
PERGUNTA:- Mas não seria Roma, justamente na época brilhante de Augusto, a mais indicada para a missão de Jesus?
RAMATÍS:- Jamais o Mestre Cristão conseguiria em Toma aqueles discípulos fiéis, que foram coletados à margem do Mar de Genesaré e nas planícies da Galiléia, pois nenhum romano ambicioso abandonaria as redes de pesca e os seus interesses comuns, para aceitar o convite de um homem empolgado por um reino hipotético de amor e bondade! Como atrair a atenção dos sanguinários gladiadores dos circos romanos, para fazê-los compreender a lição singela do “grão de mostarda”? Qual a maneira capaz de situar, a contento, entre as matronas de costumes dissolutos, a recomendação do “vai e não peques mais”, como advertência à mulher adúltera? Jesus não teria êxito pregando o amor, a paz, a tolerância, o perdão e a renúncia entre as ferozes legiões de César; e seria motivo das chacotas mais ferinas, caso tentasse o “sede puros e perfeitos, como puro e perfeito é vosso Pai”, entre os glutônicos romanos amigos de banquetes pantagruélicos regados a tonéis de vinho!
Já de início, ele se sentiria impotente para converter os romanos ao culto de um só Deus, pois isso implicaria em despojá-los de sua fé interesseira e dos deuses que lhes atenderiam todos os desejos, caprichos e lhes presidiam os amores, negócios, divertimentos, jogos de circo, as conquistas guerreiras como a fertilidade genésica! Viris e ambiciosos, personalistas e insensíveis, cúpidos e dissolutos, raríssimos cidadãos romanos poderiam impressionar-se com os apelos para a humildade, renúncia, pureza e frugalidade. Em Roma, o povo rendia tributo religioso quase como quem acerta seus negócios e liquida débitos numa conta corrente! E o que era mais importante: os deuses também lhes deviam a obrigação e a glória de serem divulgados e cultuados nas longínquas províncias da Gália, Palestina, Germânia, Síria ou Egito, onde tremulavam as águias de Roma. Só o povo de Israel, realmente, seria capaz de realçar a figura angélica de Jesus, no cenário do Mundo.
PERGUNTA:- Mas a força espiritual de Jesus não seria suficiente para a ele vencer todos os óbices encontrados no ambiente físico em que devesse encarnar-se?
RAMATÍS:- Se bastasse somente a força espiritual de Jesus para afastar todas as dificuldades naturais do mundo físico, é evidente que ele também não precisaria encarnar-se na Terra para esclarecer “pessoalmente” o homem, pois isso poderia ser feito do próprio mundo invisível e só em Espírito. Para servir a humanidade encarnada Jesus necessitou mobilizar os mesmos recursos dos demais homens e honestamente enfrentar as mesmas dificuldades. Embora se compreenda que o gênio já existe na intimidade do pintor excelso ou do compositor incomum, o certo é que o primeiro precisa de pincéis e tintas; e o segundo, de instrumentação musical, para, então, darem forma concreta às suas criações mentais!
Jesus também era um gênio, um sábio e um anjo, em espírito, mas precisou exilar-se na matéria, para entregar pessoalmente a sua mensagem de salvação do homem. Em conseqüência, serviu-se de instrumentação carnal apropriada e enfrentou os óbices naturais do mundo físico para realizar sua tarefa de esclarecimento espiritual. Ele só dispunha do curto prazo de 33 anos para cumprir sua tarefa messiânica, como o sintetizador de todos os instrutores espirituais que o haviam antecedido. Sua obra exigia uma conformação absoluta ao gênero humano e um exemplo pessoal incomum, sem gozar de privilégios extemporâneos do mundo invisível, que depois enfraquecessem as convicções dos seus discípulos ou produzisse o milagre que gera a superstição!
PERGUNTA:- Podemos crer que o advento de Jesus à Terra deveria ser efetuado rigorosamente há dois milênios? Ou esse fato tanto poderia ocorrer alguns séculos antes ou depois?
RAMATÍS:- O “acaso” é coisa desconhecida no Cosmo, pois tudo obedece a um plano inteligente; e os mínimos acontecimentos da vida humana interligam-se às causas e efeitos em correspondência como esquema do Universo Moral. Sem dúvida, há um fatalismo irrevogável no destino do home – a sua eterna Felicidade! Ninguém, jamais, poderá furtar-se de ser imortal e venturoso, pois se isso fosse possível, Deus também desapareceria, porque o espírito humano é da mesma substância do Criador! Dentro do plano inteligente de aperfeiçoamento dos homens e dos mundos, o Alto atende aos períodos de necessidades espirituais das humanidades encarnadas, assim que elas se manifestam mais sensíveis para as novas revelações e evolução dos seus códigos morais.
Na época exata dessa necessidade ou imperativo de progresso espiritual, manifesta-se na Terra um tipo de instrutor eletivo a cada raça ou povo, a fim de apurar-lhe as idiossincra0sias, ajustar o temperamento e eliminar a superstição. É uma vida messiânica de esclarecimento sobre o fanatismo religioso e o preparo de um melhor esquema espiritual para o futuro. Antúlio, o filósofo da Paz, pregou aos atlantes aas relações pacíficas entre os homens; Orfeu deixou seu rasto poético e saudosa melodia de confraternização entre os gregos; Hermés ensinou no Egito a imortalidade da alma e as obrigações do espírito após a morte do corpo físico; Lao Tse e Confúcio, atenderam ao povo chinês, semeando a paciência e a amizade sob as características regionais; Moisés, quase à força, impôs a idéia e o culto de Jeová, um único Deus; Zoroastro instruiu os persas na sua obrigação espiritual; Crisna despertou os hindus para o Amor a Brahma, e Buda, peregrinando pela Ásia, aconselhou a purificação da mente pela luz do coração.
Todas as encarnações desses instrutores espirituais precederam Jesus no tempo certo e obedecendo a um programa evolutivo delineado pelo Alto! Eles amenizaram paixões, fundiram crenças, fortaleceram a mente terrena, aposentaram deuses epicuristas, propuseram deveres e prepararam a humanidade para fazer jus à crença em um só Deus e a disciplinar-se por um só Código de Moral do mundo, o qual seria o Evangelho! Malgrado cada povo interprete a idéia da Divindade o seu critério e a tradição de sua raça, o certo é que todos os missionários do Espírito descidos à Terra só tinham um objetivo; pregar a compreensão de um só Deus! A humanidade pouco a pouco apercebe-se de que na essência dos vocábulos de cada raça a idéia unitária de Deus é sempre a mesma, quer o chamem de Alá, Tupã, Jeová, Zâmbi, Rá, Foco Criador, Absoluto, Parabrhm, Senhor do Mundos, Energia Universal, Grande Espírito ou Motor Imóvel.
Conseqüentemente, Jesus também baixou à Terra no tempo exato para sintetizar os ensinamentos dos seus predecessores, e a época dessa necessidade espiritual foi exatamente há dois mil anos!
PERGUNTA:- Embora considerando que a Palestina foi, na realidade, o ambiente mais apropriado para Jesus realizar sua missão redentora, por que ele nasceu na Galiléia tão rústica e estigmatizada pelos seus contemporâneos, se podia fazê-lo melhor, nascendo em Jerusalém?
RAMATÍS:- Repetimos que Jesus foi um espírito eleito para sacudir o pó das superstições religiosas e esclarecer doutrinas, que ainda sacrificavam animais e até seres humanos a um Deus cruel! Ele carecia de um cenário estimulante e inspirativo, que lhe avivasse incessantemente a memória espiritual do mundo angélico. Embora fosse um espírito excelso e sábio, era-lhe conveniente um incentivo e encanto proporcionados pela beleza e pela poesia terrena, que assim o ajudaria a sustentar sua mente em um nível de maior rendimento messiânico.
A vida singela e encantadora da Galiléia, que já descrevemos, com seu clima ameno, não exigia resguardo severo para proteger a saúde; dava conforto e tranqüilidade ao seu povo sem exigir os requintes complicados do luxo oneroso. E servia a Jesus de contínua inspiração, amenizando-lhe o exílio sacrificial da carne, mediante a beleza, a ternura e o fascínio de sua paisagem. O povo Galileu, feliz e satisfeito, habituado a alimentação leve e fácil, que não afogueava o sistema neurodisgestivo, era um público assíduo e ideal para ouvir as prédicas de Jesus e que se comovia ante as boas novas do Paraíso e as deliciosas parábolas sobre os deveres do espírito imortal!
Jerusalém, no entanto, era um ambiente oposto à emotividade de Jesus, pois a cidade era foco constante de conflitos, sedições religiosas e fanatismos supersticiosos, através de um povo avaro, cúpido, intriguento, inescrupuloso e ainda explorado por um sacerdócio cuja cultura religiosa era apenas canônica ou teológica. O estudo da Lei Mosaica, ou do Torá, não ira além de fatigantes discussões muito parecidas com as que ainda hoje ocorrem entre as seitas protestantes, às vezes, por causa da troca de uma vírgula ou de um erro tipográfico na Bíblia!
Jerusalém era pedregosa e antipática, sua paisagem monótona e melancólica, os seus vales produzidos pelos desmoronamentos, sempre atulhados de lixo, serviam de moradia aos vagabundos ou infelizes leprosos. Não havia água em abundância, os córregos eram sujos e os pastos secos. Os animais dos caravaneiros retardados pousavam fora dos muros da cidade. Nos dias quentes, o mau odor do capim apodrecido, do suor e do mau cheiro dos animais espalhava-se pelos subúrbios da cidade. No verão, as lajes batidas pelo sol ardente aqueciam os pés e os calçados dos transeuntes, os quais suavam envoltos nos seus trajes pitorescos.
Em Jerusalém crescia a azáfama das cidades asiáticas; ali se misturavam a sujeira das ruas, os excrementos dos animais e a exalação do péssimo esgoto mal distribuído. Os mercados estabelecidos pela Prefeitura faziam rebuliço e entravam em rixa com os vendeiros ambulantes, disputando fregueses para compra de peixe, de cerâmica, de tecido, hortaliças ou quinquilharias. A confusão e os gritos recrudesciam ante as súplicas obstinadas dos mendigos e enfermos, próprios dos grandes ajuntamentos de criaturas. A cidade oferecia um aspecto árido e desagradável para um espírito do quilate de Jesus; e jamais ele poderia aquecer ali os sonhos e os ideais acalentados desde a infância em Nazaré.
Embora o Alto tenha escolhido a Palestina como o local adequado para a missão de Jesus, a beleza da Galiléia e a ternura de Nazaré serviram para alimentar-lhe a chama sublime do seu Amor inesgotável a favor da humanidade!
PERGUNTA:- Naturalmente, Jesus se deixou influenciar fortemente pela raça judaica em que viera encarnar, embora fosse um espírito universalista. Não é assim?
RAMATÍS:- As raças, os povos e os homens são apenas ensejos educativos e transitórios, que revelam à luz do mundo material as aquisições feitas pelo espírito imortal. Poder-se-ía dizer que a face dos planetas serve para o espírito verificar e comprovar a sua consciência, o que ele já realizou em si mesmo. Deste modo, ele extrai ilações pessoais de sua capacidade, resistência, renúncia, individualidade e do seu talento espiritual. Apura o espírito e passa a cultuar as manifestações que mais se enquadram nos códigos morais dos mundos superiores. Esforça-se depois para anular ou mesmo evitar os ascendentes que lhe retardam a paz e a ventura definitivas!
Eis por que, reportando-nos ao passado, verificamos que inúmeras raças, depois de se imporem na face do orbe pelo fausto, cultura, comércio, descobertas ou conquistas belicosas, desapareceram completamente, deixando raros vestígios. Assim é que Babilônia, Fenícia, Sodoma, Gomorra, Herculanum, Pompéia, Hititia, Caldéia, Cartago e as civilizações atlantes sumiram do mapa terráqueo; e a Pérsia, Etiópia, Ebréia, Egito e outras velhas nações também começam a oscilar nos seus alicerces, mal sustentando sua glória e poderes tradicionais do passado.
Mas é evidente que o amor manifesto por um chinês, árabe, russo, italiano ou groenlandês é sempre o mesmo em sua essência, embora varie o tipo do instrumento físico de que o espírito se utiliza para isso. Jesus, portanto, quer fosse judeu ou inglês, revelaria sempre o seu intenso e incondicional amor pela humanidade, malgrado tivesse de manifestá-lo pelas características próprias da raça que lhe fornecesse o equipo carnal. A prova mais concreta de que ele não foi um judeu no sentido racista da palavra, mas um homem cuja doutrina moral e religiosa se destina a toda humanidade, é que os próprios judeus “ainda não o reconheceram”, conforme prediziam os velhos profetas do Antigo Testamento.
Em sua época, civilizações como a Grécia, Pérsia e o Egito, já haviam dado ao mundo inúmeros sacerdotes, filósofos, cientistas, sábios, escritores e poetas. Mas eles ainda se prendiam à avidez da especulação metafísica, sem apresentar soluções prosaicas que, pelo menos, ajudassem o homem comum a melhorar sua existência e treinar praticamente a sua consciência moral! Platão discursava o advento de uma humanidade só integrada por artistas, filósofos, poetas e cientistas; Sócrates pregara uma conduta moral avançada, mas dependendo de certos grupos eletivos para cultuá-la; Epicuro ensinara a substituição das dores corporais pelos prazeres do espírito e Zenon explicava o estoicismo na crueza dos sofrimentos, cujas doutrinas, embora louváveis, exigiam, no entanto, muito força de vontade, pertinácia e boa dose de otimismo, para sublimar o sofrimento humano e especular sobre a metafísica.
Jesus não trazia mensagem complexa, nem pedia investigação técnica e teórica para enriquecer o intelecto, pois apregoava uma auto realização singela e à luz do dia, através de um trabalho lento, mas eficiente, do espírito libertar-se da matéria. A simplicidade, a fé, a devoção, a humildade, a resignação, a pureza, a ternura, o perdão, a renúncia e o serviço ao próximo eram coisas possíveis e realizáveis à face da Terra. E ninguém poderia zombar ou descrer disso, porque o Mestre que ensinava era o exemplo vivo de suas próprias recomendações. Não dizia Jesus comumente aos seus apóstolos: Se ainda não compreendeis asa coisas da Terra, como quereis que vos fale só das coisas do céu?”
Ele era objetivo e suas parábolas versavam sobre coisas tangíveis e assuntos de bom senso, tais como a “semente da mostarda, os talentos enterrados, o fermento que leveda o joio e o trigo, o lobo e o cabrito, o bom samaritano, o filho pródigo, o tesouro escondido, o mordomo infiel, o semeador ou o rico insensato”!
Não era um judeu predicando para judeus, mas um representante da humanidade dos céus, falando para todas as criaturas, porque sua linguagem, até hoje, é perfeitamente entendível por todos os povos e raças. Não foi o vaso carnal da raça israelita que condicionou o espírito de Jesus a uma ética ou temperamento peculiar, ou lhe modelou a maneira de ensinar, incentivado por características específicas de um povo; o seu Espírito sublime é que iluminou a linhagem biológica do judeu!