segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

O SUBLIME PEREGRINO DÉCIMA SÉTIMA PARTE - 2

   PERGUNTA:- Embora já tenhamos sido notificados de algumas distrações do menino Jesus, gostaríamos de saber quais foram os brinquedos e os folguedos que ele mais preferiu durante sua infância.
        RAMATÍS:- O menino Jesus, como espírito de elevada estirpe sideral, aprendia com extrema facilidade qualquer iniciativa do seu povo, enquanto era o mai exímio oleiro da redondeza, conhecido entre as crianças do seu tempo. Destro no fabricar animais e aves de barro, às vezes devotava-se com tal ânimo e perícia criadora a esse arte infantil, que os produtos saídos de suas mãos arrancavam exclamações de espanto e admiração dos próprios adultos!
        Parecem vivos! – diziam os mais entusiastas, tomados de profundo assombro.
Sob seus dedos ágeis e delicados, o barro amorfo despertava como se lhe fora dado um sopro de vida! Jamais os seus contemporâneos percebiam que ali se achava o anjo exilado na carne sublimando as substâncias do mundo material em figuras de contornos poéticos e atraentes. Os pequeninos comparsas rodeavam Jesus, atentos e espantadiços da rapidez com que ele transformava um punhado de barro argiloso na figura esbelta de uma ave ou animal, que só faltavam falar num movimento impulsivo de vida! Depois, eles corriam céleres, para casa, agitando em suas mãos as figuras confeccionadas por Jesus, que então ria, feliz, como um príncipe dadivoso!
        Naquela época a escultura de barro era inferior, feita às pressas e de caráter exclusivamente comercial, somente de enfeite nos lares mais pobres, porquanto as obras de arte de natureza mais fina provinham do Egito, da Índia e de Tiro, a pedido de romanos e hebreus ricos. As mãos do menino Jesus davam um toque de tal beleza e meiguice nos seus produtos esculturais, o que era fruto de sua inspiração angélica ainda incompreensível, que os artesãos mais primorosos não temiam de colocá-los a par das ourivesarias mais finas e de bom gosto.  Durante o seu trabalho de arte na argila, Jesus mostrava-se sério e compenetrado, os lábios contraídos e um vinco de alta inspiração cruzava-lhe a fronte angélica até o término do seu trabalho. Quando se dava por satisfeito e finalizava sua obra, a sua fisionomia se desafogava e seu rosto abria-se numa expressão da mais infantil alegria!
        No entanto, depois desse labor, jamais ele se ligava à sua obra, nem se preocupava com o seu valor ou posse; o que saía de suaas mãos já não lhe pertencia e o dava facilmente ao primeiro que o pedisse! Menino ainda, já revelava a contextura do Mestre, que mais tarde recomendaria: “Não queirais entesourar para vós tesouros na terra; onde a ferrugem e a traça os consomem; e onde os ladrões os desenterram, e roubam. Mas entesourai para vós tesouros no céu, onde não os consome a ferrugem nem a traça, e onde os ladrões não os desenterram nem roubam. Porque onde está o teu tesouro, aí está também o teu coração”. (Mateus, cap. VI, VS. 19. 20 e 21).
         Mas ele também se entregava às brincadeiras comuns da época, como o jogo de bolas de pano e de barro, que eram atiradas sobre obstáculos de madeira, derrubando-os; as travessuras com cães, cabritos e cordeiros, ou à construção de diques e lagos artificiais, cujas barcas de pesca ele as construía de gravetos e restos de madeira sobejados da carpintaria de José; e os guarnecia de remos feitos de palitos de cedro. As velas dos barquinhos, enfunadas, traíam a contribuição de Maria, com retalhos de linho e algodão de suas costuras. As frotas de galeras romanas então navegavam nas enseadas de água suja, para gáudio da gurizada sempre atenta às iniciativas e surpresas do menino Jesus, cujo espírito enciclopédico jamais encontrava dificuldades para sair-se bem de suas empreitadas infantis. Eram estradas, pontes, rios, lagos e cascatas; ou portos de carga e descarga, barracas coloridas para caravaneiros, cujos camelos e elefantes de barro descansavam à sombra de palmeiras improvisadas e sob os bosques feitos de barbas de arvoredos. Ainda havia jardins suspensos como os da Babilônia, faróis queimando torcidas de cordas untadas de aceite, à noite, para guiar as galeras retardadas que eram puxadas a barbante pelos fiéis peritos sob as ordens de Jesus menino. Enfim, era um mundo feérico, divertido e contagioso, que reunia a gurizada da redondeza; e os próprios adultos davam uma espiada, quando precisavam arrastar os filhos para o repouso noturno. Muitas vezes, Maria sentia-se dominada por estranhas emoções e as lágrimas escorriam-lhe pelas faces, vendo aquele menino como um reizinho venturoso, um deuzinho criador dirigindo o seu mundo rico de novidades e surpresas. Ele era o centro de atração da criançada buliçosa, que entre gritos de alegria e de espanto, movia-se obediente às diretrizes por ele traçadas e no intuito de preservar os brinquedos até o término dos divertimentos. Eram pequenos vassalos, louros como a espiga do milho novo, ruivos e a cabeça metida num fogaréu; ou escuros como ébano, filhos de etíopes emigrados, sardentos, pálidos e corados; sujos e limpos; confortavelmente vestidos ou esfarrapados, ali se confundiam nos limites do mundo elaborado e movimentado pelo genial menino Jesus! Era um clã de meninos, que, pouco a pouco se integrava nas disposições temperamentais e emotivas dele, pois exigia bom comportamento para o ingresso na sua “maçonaria” infantil. Então, reduzia-se a maldade para com os pássaros e os animais; diminuía-se também a traquinagem maliciosa e destruidora. Jesus inventava sempre coisas novas; do barro argiloso e da areia umedecida, compunha castelos e reis, príncipes e fortalezas, que reproduziam as histórias ouvidas de Maria, à noite, do folclore hebraico. Por isso, os próprios meninos ressentidos retornavam breve e submetiam-se à férrea disciplina de cominar o instinto daninho e os impulsos cruéis para não perderem dádivas tão atraentes.

        PERGUNTA:- Quais eram as disposições emotivas ou o entendimento religioso do menino Jesus para com a Divindade?
        RAMATÍS:- Em geral, todas as crianças hebréias temiam Jeová e bem cedo aprendiam a respeitá-lo e à sua Lei, certos de que ele espiava-lhes as traquinagens habilmente escondido atrás das nuvens. Nos dias tempestuosos, em que aas torrentes de água se despejavam dos céus, aas mães então predicavam aos filhos que Jeová estava zangado com os meninos desobedientes, e por isso atirava setas de fogo e raios incandescentes, partindo árvores e abrasando a Terra! Mas o menino Jesus arregalava os olhos sem qualquer temor, pois não podia admitir qualquer noção de castigo ou de ira por parte do Pai que estava no céu. Desprovido de má intenção e integro espiritualmente, sem ter jamais movido uma funda para ferir um animal feroz, ou inseto venenoso, no seu cérebro pequenino não havia guarida para a idéia severa que os rabis e profetas faziam de Jeová e seus anjos.
        José e Maria então desanimavam ante a infinidade de indagações que surgiam da parte de Jesus, ao tentarem convencê-lo das disposições belicosas de Jeová. Ele não temia o fragor dos trovões nem se assustava com a queda próxima do raio, porque reconhecia em tudo a obra do Senhor, que amava os seus filhos e jamais criara coisas para o sofrimento dos homens. Não podia conceber quaisquer perigos no seio da Vida, porque seu espírito sentia-se eterno e considerava a morte corporal um acontecimento de somenos importância. Sob o espanto dos companheiros e dos próprios adultos, quando a natureza se movia inquieta, o céu se escurecia com as nuvens pejadas de água e eletricidade, Jesus se rejubilava e batia palmas de contente. Inquieto, porém satisfeito, esperava a tempestade arrasadora; mas quando os raios fulminavam arvoredos e desenhavam na tela do céu serpentes de luz ameaçadoras, e a chuva caía forte, rompendo diques e inundando estradas, ninguém conseguia segurar o menino Jesus mais tempo sob o abrigo do lar.Rápido, ele escapulia e se punha longe, fora do alcance dos seus, a pular debaixo da chuva copiosa, cabelos escorridos e grudados nas faces, enquanto, como quem recebe um presente, aparava a linfa do céu na concha das mãos. Saltava, dentro das poças de lama e chapinhava na água, conseguindo, por vezes, atrair algum companheiro mais corajoso, que o acompanhava na sua festa aquática. Outros meninos, detrás das janelas rústicas, olhavam-no rindo do imprevisto do brinquedo, até que os irmãos mais velhos vinham buscá-lo de qualquer modo, mas não resistindo ao contágio das suas risadas gostosas.
        Às vezes sua silhueta recortava-se nítida sob a luz incandescente dos relâmpagos; então erguia os braços e cantarolava alegre, como se quisesse abraçar os relâmpagos e trazê-los em, feixe, para casa! Os coriscos caíam sobre o topo das colinas e lascavam a copa dos arvoredos; às vezes desciam pela encosta empedrada e desapareciam perfurando o solo. Os gritos jubilosos de Jesus confundiam-se com os brados de Tiago e Eleazar, seu tio e irmão, que o chamavam desesperadamente. Embora fosse motivo de crítica por parte dos vizinhos despeitados, era impagável aquele aspecto inusitado do menino Jesus, tão eufórico debaixo da água torrencial, assim como a ave feliz entreabre suas asas gozando a linfa criadora descida dos céus.
        Era um anjo destemeroso, certo de que a Natureza, mesmo enraivecida, não poderia fazer-lhe qualquer mal. Sabia que mediante aquela tempestade ruidosa de trovões e raios ameaçadores, o Espírito Arcangélico da Vida processava a limpeza da atmosfera, recompunha o plasma criador, carbonizava detritos perigosos, sensibilizava o campo magnético do duplo etérico da própria Terra e procedia à higiene fluídica no perispírito dos homens!
        Os seus contemporâneos não podiam comprender o desafogo espiritual do menino Jesus, diante da violência da Natureza pejada de água, raios e trovões, que amainava-lhe o potencial sidéreo atuante no seu cérebro tão frágil. Eram reações emotivas brotadas de uma alegria sã e inofensiva; um estado de espírito de absoluta confiança nos fenômenos grandiosos da própria Vida. Entregava-se à força desabrida da tormenta, buscando a compensação terapêutica psíquica, em que, sob a lei de que os “semelhantes curam os semelhantes”, o magnetismo eletrificado da atmosfera ajustava-lhe a mente superexcitada! O seu riso explodia cristalino na atmosfera densa e lavada pela chuva; até o coro dos batráquios e o pio triste das aves encharcadas pareciam participar do quadro surpreendente, em que ele era o tema fundamental. Indubitavelmente, todas as crianças sentem-se alegres e buscam a água como imperativo gostoso à sua própria natureza humana; no entanto, o menino Jesus exorbitava de toda e qualquer contemporização no caso, pois se entregava incondicionalmente à hostilidade da Natureza enfurecida, vendo nela uma vibrante manifestação da própria vida em sublime oferenda à Divindade!
        No entanto, essa extroversão da infância de Jesus, transformou-se, pouco a pouco, naquela silenciosa dor que o absorveu quando ele, na maturidade, se viu diante da maldade, da hipocrisia e do egoísmo humanos. Os pecados e os sofrimentos da humanidade pesavam-lhe no ombro e roubavam-lhe a alegria, porque sendo Jesus o mais sensível e amoroso dos homens, era quem mais sofria diante do seus irmãos desgraçados e sem esperanças!

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